Argentina aumenta o volume da televisão quando vem estender roupa na varanda. Ouvem-se cá fora os aplausos do público no estúdio, o fio ténue da voz dos que vão ao programa narrar as misérias dos seus quotidianos: uma rapariga que perdeu o pai e a mãe num desastre de automóvel, uma outra que esteve quase a suicidar-se por ser gorda e feia e lhe chamarem gorda e feia na escola, uma senhora que perdeu tudo e que agora pede ajuda para que lhe construam uma casa, uma mulher que foi violada pelo padrasto e nunca mais se endireitou na vida…
……… Ela não perde pitada enquanto vai estendendo a roupa, e às vezes, interrompe a tarefa para espreitar para dentro de casa e ver as imagens dos espectadores chorosos, os rostos em grande plano, o brilho das lágrimas recobrindo emocionados olhos. Argentina comove-se também. Comove-se muito. E enxuga as lágrimas num pano de cozinha que, logo depois, está corando ao sol que, de manhã, bate com força nas fachadas de Miragaia.
A Dona Argentina de Manuel Jorge Marmelo – O profundo Silêncio das manhãs de domingo
……… Ela não perde pitada enquanto vai estendendo a roupa, e às vezes, interrompe a tarefa para espreitar para dentro de casa e ver as imagens dos espectadores chorosos, os rostos em grande plano, o brilho das lágrimas recobrindo emocionados olhos. Argentina comove-se também. Comove-se muito. E enxuga as lágrimas num pano de cozinha que, logo depois, está corando ao sol que, de manhã, bate com força nas fachadas de Miragaia.
A Dona Argentina de Manuel Jorge Marmelo – O profundo Silêncio das manhãs de domingo