Se perguntarem: das artes do mundo?
Das artes do mundo escolho a de ver cometas
despenharem-se
das grandes massas de água: depois, as brasas
pelos recantos,
charcos entre elas.
Quero na escuridão revolvida pelas luzes
ganhar baptismo, ofício.
Queimado nas orlas de fogo das poças.
O
meu nome é esse.
E
os dias atravessam as noites até aos outros dias, as noites
caem dentro dos dias – e eu estudo
astros desmoronados, mananciais, o segredo.
Laranja, peso, potência
Laranja, peso, potência.
Que se finca, se apoia, delicadeza, fria
abundância.
A
matéria pensa. As madeiras
incham, dão luz. Apuram tão leve açúcar,
tal golpe na língua. Espaço lunado onde a
laranja
recebe soberania.
E
por anéis de carne artesiana o ouro sobe à cabeça.
A
ferida que a gente é: de mundo
e
invenção. Laranja
assombrosamente. Doce demência, arrancada à
monstruosa
inocência da terra.
Não toques nos objectos imediatos
Não toques nos objectos imediatos.
A
harmonia queima.
Por mais leve que seja um bule ou uma chávena,
são loucos todos os objectos.
Uma jarra com um crisântemo transparente
tem um tremor oculto.
É
terrível no escuro.
Mesmo o seu nome, só a medo o podes dizer.
A
boca fica em chaga.
Herberto Helder