Wednesday, December 3, 2008

A janela da Rosinha

Sempre que comunicávamos ela dizia-me fazê-lo da cozinha. Quando o voltava a fazer, insistia novamente, para que não restassem dúvidas. Aliás, toda a sua existência parece girar em cerca dela. Contudo, apenas ontem compreendi porquê. Do ponto elevado onde esta se encontra, há uma rasgada janela debruçada para o mundo, donde dia a dia ela abraça todo o infinito. Dali, observamos a imensidão ofuscada pelo brilho do sol, e perdemos por completo a noção do tempo, que se desenrola lentamente, com variações melancólicas e serenas, de acordo com cada uma das estações. Distante do espartilho da cidade, e de tantas monstruosidades arquitectónicas, a serra de Monchique domina a paisagem, e reserva-nos espaço a sonhar. Mais além, formas abstractas saem da sombra salpicadas de luz, como se nos apontassem caminhos, e nos dissipassem incertezas. Ao lusco-fusco, quando a tarde se desfaz, parto ao som da cantilena dos pássaros, conseguindo imaginar o dia virando noite, e o manto escuro que em breve tudo cobrirá. Da próxima vez que lá for, atenta aos pormenores sem paralelo, na suspensão do tempo tentarei de novo ouvir o sussurrar da natureza, e sem nunca desviar o olhar partir em busca de outros horizontes.