No outro dia andei por lá perto, e resolvi bater-lhe à porta. Agradavelmente surpreendida sorriu-me do cimo das escadas, e convidou-me a subir. A casa de concepção rústica está virada para um jardim relvado, e ao galgar a escadaria fui imediatamente transportada para o universo dos seus sonhos. Azulejos revestem parcialmente as paredes, os tectos parecem perder-se em altura, e todo o interior marcado pela tradição dos traços, não poderia ser mais acolhedor, e familiar. O mobiliário, as estantes a transbordar de livros, as peças com história, as mesinhas com fotos de família, as vitrinas repletas de colecções, ou qualquer outro objecto, se encontra habilmente posicionado. Nada está fora do lugar, e tudo é mantido em imaculada limpeza, à custa do seu próprio esforço. Nesse fim de manhã, o sol entrava a jorros através dos vidros cristalinos das janelas, que reluzindo de asseio, enalteciam os seus quadros, harmoniosamente distribuídos por tudo quanto é lado. São eles que lhe personalizam o espaço, transformando-o numa pequena grande galeria! Alguns evocam paisagens exóticas, outros jardins encantados, e outros ainda há, que nos levam até à tranquilidade das planícies alentejanas. Mais recentemente a sua imaginação sem limites impeliu-a para o abstracto – o arranque para um novo caminho, e para as cores mais intensas, transmitindo-nos uma energia, fora do comum, na sua idade avançada. De lá de fora ouvia-se o bulício da circulação automóvel, e avistava-se a Câmara Municipal. Conta-me até, que no último espectáculo da Dulce Pontes ao ar livre, foi dali mesmo, que o vislumbrou, sem quaisquer atropelos. Apesar de uma infância marcada pelo rigor de outros tempos, e de um itinerário de vida por vezes penoso, resistiu ao tempo abraçando a pintura como a sua maior forma de expressão. Simples, e despretensiosa, sem dúvida que a Tininha foi uma das pessoas, que verdadeiramente mais gostei de conhecer na UATI. E qualquer dia, quando por lá passar, sem hesitação volto a bater-lhe à porta.