Monday, July 6, 2015

O exercício da magia

Por isso ele era rei, e alguém
 se punha diante da realeza para ter um pensamento, uma palavra
súbdita: dá-me um nome, uma
 baforada
 desfere o ceptro contra a minha testa para eu ver
 uma constelação maior que onze varas,
 enche de hélio o espaço reservado à minha glória quando me volto
 na escuridão com toda a potência
dos raios, dizia, o torso envolto pelas ramagens
 do fogo,
 bate-me na testa e que eu seja a minha luz, onze
varas de luz para os braços torcidos,
uma camisa aos rasgões brilhantes por força
da entrada e saída
do ar, porque de ti recebo a soberania e lanço pela boca
 petróleo a arder como no circo dos prodígios
 fazem os reis terríveis,
 por isso também eu tenho o poder e o sítio e o exercício
 desta magia: a realeza de uma combustão,
acto, verbo,
e em estado natural os elementos:
 madeira, cristal e ouro, e o ar movendo
 o poema número a número.
  


 Herberto Helder in Poesia Toda, Lisboa: Assírio & Alvim, 1996