Não, o meu não, que não passo dum comum mortal. Refiro-me ao dele, que se fosse vivo faria hoje 120 anos. Sim, esse mesmo que está a pensar. Qual deles exactamente? Todos. Desde Bernardo Soares, ou Álvaro de Campos ao poeta fingidor, e o resto dos heterónimos. Um pacato funcionário de escritório que sabe-se lá como, ou porquê, dá lugar às múltiplas personagens por todos mais que conhecidas, transformando-se tão-somente no verdadeiro génio. Como muitos outros foi um espírito inquieto, por vezes desassossegado até, e um solitário, com a particularidade de possuir uma multidão dentro de si. Dotado de uma extraordinária capacidade de inventar, e nos conseguir transmitir a sonoridade do dia a dia, com os sonhos, angústias, e desilusões que dele fazem parte. O seu mundo era o dos livros, cheio de ideias, projectos, e ambiciosos planos, necessitando compulsivamente de escrever. Há nele um apelo interior tal, que o chega a fazer sem parar, durante noites maiores a fio, e em pé! Entrar no seu universo é embarcar numa autêntica viagem cósmica, que desagua na modernidade da nossa língua!
O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.
O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.
Fernando Pessoa