Saturday, November 30, 2013
Friday, November 29, 2013
Conforme o gosto
Para começar utilizo os
ingredientes mais frescos da época. E, depois de a reduzir a puré, e obter uma
textura macia e cremosa, adiciono-lhe sempre alguma coisa que a torne diferente
de umas vezes para as outras. Frequentemente, acrescento-lhe coentros ou salsa
picada, ou cebolinho como guarnição. Mas, também posso polvilhá-la de pimenta-preta
quando faz mais frio, ou, em alternativa, adiciono-lhe uma colher cheia de
crème fraîche, ou simplesmente a acompanho de croutons ou de um simples fio de
azeite extra virgem. O segredo é servir qualquer sopa, imediatamente, uma vez
retirada do lume, e, sem pressas, apreciar cada colherada de cor intensa e
repleta de sabores. Bon appétit!
Thursday, November 28, 2013
Renascer
O orvalho da muita manhã.
Corria de noite, como no meio da alegria,
pelo orvalho parado da noite.
Luzia no orvalho. Levava uma flecha
pelo orvalho dentro, como se estivesse a ser caçado
loucamente
por um caçador de que nada se sabia.
E era pelo orvalho dentro.
Brilhava.
Não havia animal que no seu pêlo brilhasse
assim na morte,
batendo nas ervas extasiadas por uma morte
tão bela.
Porque as ervas têm pálpebras abertas
sobre estas imagens tremendamente puras.
Pelo orvalho dentro.
De dia. De noite.
A sua cara batia nas candeias.
Batia nas coisas gerais da manhã.
Havia um homem que ia admiravelmente perseguido.
Tomava alegria no pensamento
do orvalho. Corria.
Ouvi dizer que os mortos respiram com luzes transformadas.
Que têm os olhos cegos como sangue.
Este corria, assombrado.
Os mortos devem ser puros.
Ouvi dizer que respiram.
Correm pelo orvalho dentro, e depois
estendem-se. Ajudam os vivos.
São doces equivalências, luzes, ideias puras.
Vejo que a morte é como romper uma palavra e passar
— a morte é passar, como rompendo uma palavra,
através da porta,
para uma nova palavra. E vejo
o mesmo ritmo geral. Como morte e ressurreição
através das portas de outros corpos.
Como uma qualidade ardente de uma coisa para
outra coisa, como os dedos passam fogo
à criação inteira, e o pensamento
pára e escurece
— como no meio do orvalho o amor é total.
Havia um homem que ficou deitado
com uma flecha na fantasia.
A sua água era antiga. Estava
tão morto que vivia unicamente.
Dentro dele batiam as portas, e ele corria
pelas portas dentro, de dia, de noite.
Passava para todos os corpos.
Como em alegria, batia nos olhos das ervas
que fixam estas coisas puras.
Renascia.
Herberto Helder in A faca não corta o fogo - assírio
& alvim, 2008
Wednesday, November 27, 2013
O paraíso perdido
Nunca mais tiveram paz. Entre o
quotidiano lúgubre e o que viveram, esta era, agora, a vida deles.
Definitivamente, a realidade não era mais a de outrora. Os sacrifícios tinham
sido demasiados e mal dirigidos, as decisões cegas, os desnivelamentos sociais mais
que evidentes e o rumo ter-se-ia complicado. Estes eram eles, e nenhum era mais
inocente do que o outro. Fingir que não falharam? Só se estivessem a brincar
com eles! Sem se ver o fim, e cansados de esperar por quem os fosse salvar, mais
do que nunca, era necessário contrariar o que estava a acontecer, desviar o olhar
e voltar a sentir os dias de outra maneira. Entre todos havia uma unanimidade de
um desejo maior. O de descobrir novas medidas e outras soluções.
Tuesday, November 26, 2013
A nudez da alma
Inventei a dança para me disfarçar.
Ébria de solidão eu quis viver.
E cobri de gestos a nudez da minha alma
Porque eu era semelhante às paisagens esperando
E ninguém me podia entender.
Sophia de Mello Breyner Andresen in Tempo Dividido, 1954
Ébria de solidão eu quis viver.
E cobri de gestos a nudez da minha alma
Porque eu era semelhante às paisagens esperando
E ninguém me podia entender.
Sophia de Mello Breyner Andresen in Tempo Dividido, 1954
Monday, November 25, 2013
Uma série de fantasmas
O que era vida irreal, é agora realidade,
o que era vergonha, ninharia e ridículo, é vida agora.
O que toma pé são os sonhos,
o que se agita são as paixões desregradas.
Não há limites nem peias.
Vêem-nos como eu te vejo a ti.
Tenho diante de mim este espectáculo,
como se fosse possível aos homens desdobrarem-se
e tomarem corpo, ideias e paixões.
Eles são aquilo que ocultamente desejavam ser,
são o que não se atreviam a ser.
Sob um mundo de verdade há outro mundo de verdade.
É esse mundo invisível e profundo
que passa a ser o inundo visível.
É esse.
Todo o homem é uma série de fantasmas
e passa a vida a arredá-los.
Chegou a vez dos fantasmas.
As nossas ideias e paixões
é que formam as figuras que actuam na vida.
raul brandão in húmus - a outra coisa, fragmento frenesi 2000
Sunday, November 24, 2013
Saturday, November 23, 2013
Friday, November 22, 2013
Um lugar na História
A nostalgia dos anos 60 faz-nos, hoje,
recuar 50 anos, a um fatídico regresso ao passado. Por detrás do mistério da
morte de JFK que, um golpe de tragédia, em directo, acabou por reforçar o mito,
tudo nos recorda o homem sedutor e de grande capacidade política que, nunca
deve ser esquecido.
Thursday, November 21, 2013
Não digas nada
Faz-me
o favor de não dizer absolutamente nada!
Supor
o que dirá
Tua
boca velada
É
ouvir-te já.
É
ouvir-te melhor
Do
que o dirias.
O
que és não vem à flor
Das
caras e dos dias.
Tu
és melhor - muito melhor!
Do
que tu. Não digas nada. Sê
Alma
do corpo nu
Que
do espelho se vê.
Mário Cesariny (1923-2006)
Wednesday, November 20, 2013
Os lugares revisitados
Certos episódios da sua vida poder-se-iam
definir tanto reais como imaginários. A um canto do jardim, mas não a demasiada
distância, encontrava-se uma pequena casa para pássaros. A excitação do
regresso de alguma ave mais inquieta repetir-se-ia ao longo das diferentes
estações do ano. Espectadora atenta, acaba por desenvolver uma intuição apurada
que lhe deslindasse quaisquer sinais, e a única referência, ressalte-se, face à
expectativa, era continuar a sonhar com a sua própria fuga e libertação como se
as suas vidas coexistissem e originassem alguma coisa de novo.
Tuesday, November 19, 2013
Passagens interditas
cheguei às portas secretas
atravessei as passagens interditas
e
no labirinto que negou os meus passos
vi tesouros que não eram meus
Maria Alexandre Dáskalos
Monday, November 18, 2013
Sunday, November 17, 2013
Espantar o frio
Depois do sol, os fins de tarde
passaram, então, a ser reservados junto à lareira. Era para lá que a atenção se
deslocava, tardiamente, aquando as indesejadas temperaturas mais baixas. Em
redor, uma a uma, as crianças iam-se aproximando à vez, mantendo a tradição
viva, em busca do lugar mais quentinho. Tudo o resto deixava de ser questão.
Saturday, November 16, 2013
Friday, November 15, 2013
O tempo de oiro
Era o tempo das amizades visionárias
Entregues à sombra à luz à penumbra
E ao rumor mais secreto das ramagens
Era o tempo extático das luas
Quando a noite se azulava fabulosa e lenta
Era o tempo do múltiplo desejo e da paixão
Os dias como harpas ressoavam
Era o tempo de oiro das praias luzidias
Quando a fome de tudo se acendia.
Sophia de Mello Breyner Andresen
Thursday, November 14, 2013
Refém de uma má opção
Apesar de ela compreender que a
toponímia era essencial para preservar as raízes de cada localidade, propunha
uma revisão mais cuidada ao nome da sua rua, através de uma nova leitura que, se
ajustasse a uma informação factual isenta de artifícios. E que, mesmo longínqua
no tempo, fosse real, e se relacionasse com uma lógica agora inexistente. Não
se importava que evocassem um passado, mas ao mesmo tempo, exigia que lhe
prometessem um futuro que, a partir de recordações concretas, conduzissem o
processo a uma escolha consensual e justa.
Wednesday, November 13, 2013
Uma coisa inocente
Estendi a mão
por qualquer coisa inocente
uma pedra, um fio de erva, um milagre
preciso que me digas agora
uma coisa inocente
Não uses palavras
qualquer palavra que me digas há-de doer
pelo menos mil anos
não te prepares, não desejes os detalhes
preciso que docemente o vento
o longínquo e o próximo
espalhe o amor que não teme
Não uses palavras
se me segredas
aquilo que no fundo das nossas mentiras
se tornou uma verdade sublime
José Tolentino
Mendonça
Tuesday, November 12, 2013
Monday, November 11, 2013
Por portas e travessas
Através dos vidros límpidos, atrás
dos quais se escondia, a cada dia retomava o registo da vida de personagens a
quem dava vida. Os movimentos e as expressões dos corpos, e os passos
apressados, tal como os mais miudinhos, transformavam-se numa experiência de
partilha num contínuo recomeçar. Em cada um deles procurava uma história que, ainda
que a preto e branco, deixasse advinhar, com exactidão, os mais variados
retratos, dentro da maior diversidade, no pressuposto de que pudessem existir.
Sunday, November 10, 2013
A dúvida
Então, enchendo-se de curiosidade, correu atrás do
coelho campo afora, chegando justamente a tempo de o ver desaparecer numa
grande toca sob a cerca. No instante seguinte, Alice entrou na toca atrás dele,
sem sequer pensar em como é que iria sair dali depois.
A toca do coelho, de início,
alongava-se como um túnel, mas de repente abria-se como um poço, tão de repente
que Alice nem teve um segundo sequer para pensar em parar, antes de cair no que
parecia ser um buraco muito fundo. Ou o poço era profundo demais, ou ela caía
muito devagar, pois teve tempo de sobra durante a queda para olhar em volta e perguntar-se
o que iria acontecer a seguir.
Lewis Carroll in Alice no País das Maravilhas
Saturday, November 9, 2013
Da tranquila distância
De longe te hei-de amar
- da tranquila distância
em que o amor é saudade
e o desejo, constância.
Cecília Meireles in Canções
- da tranquila distância
em que o amor é saudade
e o desejo, constância.
Cecília Meireles in Canções
Friday, November 8, 2013
Uma análise aprofundada
Por um ímpeto, tudo somado poderia considerar-se valioso. Uma
panóplia de elementos que se tornara um bom exemplo duma colecção
essencialmente romântica. Eis, o seu espaço-tempo de sonho! Poderia ter
recolhido caixas de fósforos, bilhetes de autocarro, antigos cromos, ou encaixilhado
borboletas espalmadas, ou optado por apanhar pequenas conchas na praia, mas a
sua escolha revelava-se, afinal, mais inventiva. Rebuscadas procuras, davam
destaque a outro tipo de objectos que, certamente exigiriam algum investimento,
ao longo dos anos. Contudo, a necessidade de guardar era mais forte que
qualquer outra coisa, e o início do seu espírito empreendedor.
Thursday, November 7, 2013
Um suicídio
Diz-se que a
tarde cai. Diz-se que a noite também cai. Mas eu encontro o contrário: a manhã
é que cai. Por um cansaço de luz, um suicídio da sombra.
Mia Couto in O
Fio das Missangas
Wednesday, November 6, 2013
Tuesday, November 5, 2013
O talento humano
O actor acende a boca. Depois, os cabelos.
Finge as suas caras nas poças interiores.
O actor põe e tira a cabeça
de búfalo.
De veado.
De rinoceronte.
Põe flores nos cornos.
Ninguém ama tão desalmadamente
como o actor.
O actor acende os pés e as mãos.
Fala devagar.
Parece que se difunde aos bocados.
Bocado estrela.
Bocado janela para fora.
Outro bocado gruta para dentro.
O actor toma as coisas para deitar fogo
ao pequeno talento humano.
O actor estala como sal queimado.
O que rutila, o que arde destacadamente
na noite, é o actor, com
uma voz pura monotonamente batida
pela solidão universal.
O espantoso actor que tira e coloca
e retira
o adjectivo da coisa, a subtileza
da forma,
e precipita a verdade.
De um lado extrai a maçã com sua
divagação de maçã.
Fabrica peixes mergulhados na própria
labareda de peixes.
Porque o actor está como a maçã.
O actor é um peixe.
Sorri assim o actor contra a face de Deus.
Ornamenta Deus com simplicidades silvestres.
O actor que subtrai Deus de Deus.
e dá velocidade aos lugares aéreos.
Porque o actor é uma astronave que atravessa
a distância de Deus.
Embrulha. Desvela.
O actor diz uma palavra inaudível.
Reduz a humidade e o calor da terra
à confusão dessa palavra.
Recita o livro. Amplifica o livro.
O actor acende o livro.
Levita pelos campos como a dura água do dia.
O actor é tremendo.
Ninguém ama tão rebarbativamente
como o actor.
Como a unidade do actor.
O actor é um advérbio que ramificou
de um substantivo.
E o substantivo retorna e gira,
e o actor é um adjectivo.
É um nome que provém ultimamente
do Nome.
Nome que se murmura em si, e agita,
e enlouquece.
O actor é o grande Nome cheio de holofotes.
O nome que cega.
Que sangra.
Que é o sangue.
Assim o actor levanta o corpo,
enche o corpo com melodia.
Corpo que treme de melodia.
Ninguém ama tão corporalmente como o actor.
Como o corpo do actor.
Porque o talento é transformação.
O actor transforma a própria acção
da transformação.
Solidifica-se. Gaseifica-se. Complica-se.
O actor cresce no seu acto.
Finge as suas caras nas poças interiores.
O actor põe e tira a cabeça
de búfalo.
De veado.
De rinoceronte.
Põe flores nos cornos.
Ninguém ama tão desalmadamente
como o actor.
O actor acende os pés e as mãos.
Fala devagar.
Parece que se difunde aos bocados.
Bocado estrela.
Bocado janela para fora.
Outro bocado gruta para dentro.
O actor toma as coisas para deitar fogo
ao pequeno talento humano.
O actor estala como sal queimado.
O que rutila, o que arde destacadamente
na noite, é o actor, com
uma voz pura monotonamente batida
pela solidão universal.
O espantoso actor que tira e coloca
e retira
o adjectivo da coisa, a subtileza
da forma,
e precipita a verdade.
De um lado extrai a maçã com sua
divagação de maçã.
Fabrica peixes mergulhados na própria
labareda de peixes.
Porque o actor está como a maçã.
O actor é um peixe.
Sorri assim o actor contra a face de Deus.
Ornamenta Deus com simplicidades silvestres.
O actor que subtrai Deus de Deus.
e dá velocidade aos lugares aéreos.
Porque o actor é uma astronave que atravessa
a distância de Deus.
Embrulha. Desvela.
O actor diz uma palavra inaudível.
Reduz a humidade e o calor da terra
à confusão dessa palavra.
Recita o livro. Amplifica o livro.
O actor acende o livro.
Levita pelos campos como a dura água do dia.
O actor é tremendo.
Ninguém ama tão rebarbativamente
como o actor.
Como a unidade do actor.
O actor é um advérbio que ramificou
de um substantivo.
E o substantivo retorna e gira,
e o actor é um adjectivo.
É um nome que provém ultimamente
do Nome.
Nome que se murmura em si, e agita,
e enlouquece.
O actor é o grande Nome cheio de holofotes.
O nome que cega.
Que sangra.
Que é o sangue.
Assim o actor levanta o corpo,
enche o corpo com melodia.
Corpo que treme de melodia.
Ninguém ama tão corporalmente como o actor.
Como o corpo do actor.
Porque o talento é transformação.
O actor transforma a própria acção
da transformação.
Solidifica-se. Gaseifica-se. Complica-se.
O actor cresce no seu acto.
Faz crescer o acto.
O actor actifica-se.
É enorme o actor com sua ossada de base,
com suas tantas janelas,
as ruas -
o actor com a emotiva publicidade.
Ninguém ama tão publicamente como o actor.
Como o secreto actor.
Em estado de graça. Em compacto
estado de pureza.
O actor ama em acção de estrela.
Acção de mímica.
O actor é um tenebroso recolhimento
de onde brota a pantomima.
O actor vê aparecer a manhã sobre a cama.
Vê a cobra entre as pernas.
O actor vê fulminantemente
como é puro.
Ninguém ama o teatro essencial como o actor.
Como a essência do amor do actor.
O teatro geral.
O actor em estado geral de graça.
Herberto Helder
O actor actifica-se.
É enorme o actor com sua ossada de base,
com suas tantas janelas,
as ruas -
o actor com a emotiva publicidade.
Ninguém ama tão publicamente como o actor.
Como o secreto actor.
Em estado de graça. Em compacto
estado de pureza.
O actor ama em acção de estrela.
Acção de mímica.
O actor é um tenebroso recolhimento
de onde brota a pantomima.
O actor vê aparecer a manhã sobre a cama.
Vê a cobra entre as pernas.
O actor vê fulminantemente
como é puro.
Ninguém ama o teatro essencial como o actor.
Como a essência do amor do actor.
O teatro geral.
O actor em estado geral de graça.
Herberto Helder
Monday, November 4, 2013
Um mau indício
Nada a fazia retirar-se do seu centro. A máscara
apropriara-se da sua pessoa, corroendo-a e pervertendo-a até às últimas
consequências numa demonstração de versatilidade. A qualquer momento, todo o
tipo de manobras e interferências indevidas são por ela desencadeadas ao mais
ínfimo pormenor, o que nos levava a pensar que ela cultivava uma espécie de
prazer com toda aquela trama. Numa verdadeira descida aos abismos, tece as suas
técnicas em várias direcções, num quase perfeito equilibrismo, como se de um
jogo se tratasse. E, para que conste, não se fixa, apenas, num ideal. De um
modo geral, vai-se desdobrando, fazendo uso de todos, e deitando a mão a tudo sob
as mais variadas formas e versões, num combate táctil, que a parece fascinar. Porém,
será que o vazio humanamente insuportável, mais do que qualquer coisa, a iria
fazer confrontar-se com a consciência do disfarce que envergava?
Sunday, November 3, 2013
A surpresa
Com a chegada do outono, as folhas
das árvores começaram a ficar amareladas e foram caindo, espalhando-se pelo
chão. Foi quando olhando para o céu, o patinho feio viu os cisnes
brancos.
- Que lindo e como voam!
Olhem só, mas que surpresa! O que estará realmente a acontecer?
Não acreditando, foi olhar a sua imagem reflectida no lago.
- Que surpresa, eu sou um cisne também!
Hans
Christian Andersen in O patinho feio
Saturday, November 2, 2013
Friday, November 1, 2013
Pergunta-me
Pergunta-me
se ainda és o meu fogo
se acendes ainda
o minuto de cinza
se despertas
a ave magoada
que se queda
na árvore do meu sangue
Pergunta-me
se o vento não traz nada
se o vento tudo arrasta
se na quietude do lago
repousaram a fúria
e o tropel de mil cavalos
Pergunta-me
se te voltei a encontrar
de todas as vezes que me detive
junto das pontes enevoadas
e se eras tu
quem eu via
na infinita dispersão do meu ser
se eras tu
que reunias pedaços do meu poema
reconstruindo
a folha rasgada
na minha mão descrente
Qualquer coisa
pergunta-me qualquer coisa
uma tolice
um mistério indecifrável
simplesmente
para que eu saiba
que queres ainda saber
para que mesmo sem te responder
saibas o que te quero dizer
Mia Couto
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