
Mulheres correndo, correndo pela
noite.
O som de mulheres
correndo, lembradas, correndo
como éguas abertas,
como sonoras
corredoras magnólias.
Mulheres pela noite
dentro levando nas patas
grandiosos lenços
brancos.
Correndo com lenços
muito vivos nas patas
pela noite dentro.
Lenços vivos com suas
patas abertas
como magnólias
correndo, lembradas,
patas pela noite
viva. Levando,
lembrando, correndo.
É o som delas batendo
como estrelas
nas portas. O céu por
cima, as crinas negras
batendo: é o som
delas. Lembradas,
correndo. Estrelas. Eu
ouço: passam, lembrando.
As grandiosas patas
brancas abertas no som,
à porta, com o céu
lembrando.
Crinas correndo pela
noite, lenços vivos
batendo como
magnólias levadas pela noite,
abertas, correndo,
lembrando.
De repente, as
letras. O rosto sufocado como
se fosse abril num
canto da noite.
O rosto no meio das
letras, sufocado a um canto,
de repente.
Mulheres correndo, de
porta em porta, com lenços
sufocados, lembrando
letras, levando
lenços, letras - nas
patas
negras,
grandiosamente abertas.
Como se fosse abril,
sufocadas no meio.
Era o som delas, como
se fosse abril a um canto
da noite, lembrando.
Ouço: são elas que
partem. E levam
o sangue cheio de
letras, as patas floridas
sobre a cabeça,
correndo, pensando.
Atiram-se para a
noite com o sonho terrível
de um lenço vivo.
E vão batendo com as
estrelas nas portas. E sobre
a cabeça branca, as
patas lembrando
pela noite dentro.
O rosto sufocado, o
som abrindo, muito
lembrado. E a cabeça
correndo, e eu ouço:
são elas que partem,
pensando.
Então acordo de
dentro e, lembrando, fico
de lado. E ouço
correr, levando
grandiosos lenços
contra a noite com estrelas
batendo nas patas
como magnólias
pensando, abertas, correndo.
Ouço de lado: é o
som. São elas, lembrando
de lado, com as patas
no meio das letras, o
rosto sufocado
correndo pelas portas
grandiosas, as crinas
brancas batendo. E eu
ouço: é o som delas
com as patas negras,
com as magnólias negras
contra a noite.
Correndo, lembrando,
batendo.
Herberto Helder