O senhor Valéry não gostava da sua sombra, considerava-a a pior parte de si próprio. Deste modo, o senhor Valéry apenas saía de casa depois de estudar longamente o sol e verificar que não corria riscos de a sua sombra surgir.
O senhor Valéry explicava:
- É uma mancha que por vezes se torna visível e anuncia a morte. E desenhava.
Por essa razão o senhor Valéry saía de casa quase sempre de noite, percorrendo, com uma pequena lanterna, as ruas não iluminadas.
Quando os habitantes da cidade se preparavam para jantar e pela janela viam uma pequena luz avançando a passo certo, já sabiam que ali andava o senhor Valéry; e, por vezes, pela simpatia que aquela pequena obsessão provocava, abriam a janela e cumprimentavam-no:
- Boa noite, senhor Valéry, boa noite.
Apesar do aspecto franzino do senhor Valéry, as pessoas sentiam-se mais seguras sabendo-o por ali, de noite, a percorrer as ruas com uma lanterna.
Gonçalo M. Tavares
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