Monday, August 31, 2015

Corpo deitado

Silêncio: a palavra
 respira. Corpo deitado
 no mar. Silêncio de fogo
 e música.

 Silêncio: a palavra sangra
 seu cântico de pó. Peixe
 de sombra
 mordendo as estrelas.

 A palavra só. A palavra
 refresca. Osso abandonado
 na praia deserta.

 A palavra de água
 onde nego a morte. Pausa
 do sol.


Casimiro de Brito


Sunday, August 30, 2015

Saturday, August 29, 2015

Noite Branca


Friday, August 28, 2015

Dizias tu

Sim, dizias tu, mas em seguida
corrigiste: talvez. Esta
é a única palavra
que não tem casa. Que mora
no intervalo
entre o som e o silêncio.

Albano Martins in E um lugar ao sul

Thursday, August 27, 2015

Queiram-me assim

As coisas que procuro
 Não têm nome.
 A minha fala de amor
 Não tem segredo.
  
Perguntam-me se quero
 A vida ou a morte.
 E me perguntam sempre
 Coisas duras.

Tive casa e jardim.
 E rosas no canteiro.
 E nunca perguntei
 Ao jardineiro
 O porquê do jasmim
– Sua brancura, o cheiro.

Queiram-me assim.
 Tenho sorrido apenas.
 E o mais certo é sorrir
 Quando se tem amor

 Dentro do peito.

Hilda Hilst

Wednesday, August 26, 2015

Diz-me

Diz-me, porque não nasci igual aos outros, sem dúvidas, sem desejos de impossível?


Florbela Espanca

Tuesday, August 25, 2015

Monday, August 24, 2015

Fora de série

Não é só a voz, É a cumplicidade com os músicos, a presença em palco, a postura efusiva mas sóbria, as palavras com significado, a graciosidade dos gestos, e a paixão com que canta e nos magnetiza. Ainda estou a digerir um concerto que me superou por completo as expectativas. A Carminho elevou-se e elevou-nos a um outro patamar!

Saturday, August 22, 2015

Era madrugada





Disse-te adeus
Não me lembro
em que dia de Setembro
só sei que era madrugada;
a rua estava deserta
e até a lua discreta
fingiu que não deu por nada

sorrimos à despedida
como quem sabe que a vida
é nome que a morte tem
nunca mais nos encontrámos
e nunca mais perguntámos
um p'lo outro a ninguém

que memória ou que saudade
contará toda a verdade
do que não fomos capazes
por saudade ou por memória
eu só sei contar a história

da falta que tu me fazes

Thursday, August 20, 2015

Em direcção incerta


O tempo dilatou-se ainda agora
quando te olhei nos olhos e me vi.
Em direcção incerta, dilatou-se
e depois implodiu, solene e devagar

Nunca visão alguma observada assim:
a quarta dimensão toda em avesso,
eu reflectida e refractada em luz,
assombrosas fracções mileneares

Fenómeno maior, mais do que super nova
ou que quasar: tempo aos espasmos
Tudo porque os teus olhos se afastaram
da órbita vulgar


Ana Luísa Amaral

Wednesday, August 19, 2015

Construção marítima


Tuesday, August 18, 2015

Em toda a parte

Quem a visse, sentia-a superlativamente viva ao vestir-se com o que julgava ficar-lhe bem. Pelo caminho, tudo lhe interessava desde o supérfluo ao mais profundo. Nada de assombroso, afinal.

Monday, August 17, 2015

Sunday, August 16, 2015

Indefinível

Há uma cor que não vem nos dicionários. É essa indefinível cor que tem todos os retratos, os figurinos da última estação… - a cor do tempo.

Mário Quintana

Saturday, August 15, 2015

Salto no escuro


Friday, August 14, 2015

Arte urbana


Thursday, August 13, 2015

Vento

"Às vezes ouço passar o vento; e só de ouvir o vento passar, vale a pena ter nascido."

Fernando Pessoa

Wednesday, August 12, 2015

Reconhecer

 O inferno dos vivos não é uma coisa que virá a existir; se houver um, é o que já está aqui, o inferno que habitamos todos os dias, que nós formamos ao estarmos juntos. Há dois modos para não o sofrermos. O primeiro torna-se fácil para muita gente: aceitar o inferno e fazer parte dele a ponto de já não o vermos. O segundo é arriscado e exige uma tenção e uma aprendizagem contínuas: tentar e saber reconhecer, no meio do inferno, quem e o que não é inferno, e fazê-lo viver, e dar-lhe lugar.

Italo Calvino in As Cidades Invisíveis

trad. José Colaço Barreiros -Editorial Teorema, 2002

Tuesday, August 11, 2015

Plantado

Quanto mais longe vou, mais perto fico
 De ti, berço infeliz onde nasci.
 Tudo o que tenho, o tenho aqui
 Plantado.
 O coração e os pés, e as horas que vivi,
 Ainda não sei se livre ou condenado.
  
Miguel Torga in diário XII

Monday, August 10, 2015

Em movimento


Sunday, August 9, 2015

Domingo de lazer


Wednesday, August 5, 2015

Tudo

                                                                     O voo sinuoso das aves
As altas ondas do mar
A calmaria do vento:
Tudo
Tudo cabe dentro das palavras
E o poeta que vê
Chora lágrimas de tinta.
 
Ana Hatherly (1929-2015)

Tuesday, August 4, 2015

Lento e alto

                           Algo se me assemelha
e me quer para si
 me desembainha
quando menos espero
 
Distorção do espírito
para a morte
como o corpo num salto
irremediavelmente
lento
e
alto 
Luiza Neto Jorge in Terra Imóvel - Poesia
 

Monday, August 3, 2015

A busca

eu não sei como dizer-te que cem ideias,
dentro de mim, te procuram.

Herberto Helder

Sunday, August 2, 2015

O mundo

Nesse verão nenhum de nós buscava terra firme
parecia-nos caminhar há séculos sobre as águas
Donde viemos nós? Como chegámos a esta luz
austríaca sobre as colinas
ao fumo lento no anfiteatro do golfo
à ordem aleatória do tempo?

Talvez nos caiba viver por cidades estranhas
em casas que esconderão sempre o seu medo
e a sua glória
sós diante dos céus
sem a certeza culminante
Vemos a tarde perder-se na direcção do molhe
o mundo é aquilo que nos separa do mundo


José Tolentino de Mendonça in A Poesia em 2009 [de O Viajante sem Sono] - Assírio & Alvim Lisboa, 2010.

 

Saturday, August 1, 2015