Thursday, January 31, 2013
Wednesday, January 30, 2013
À distância dos dias
o
tempo, subitamente solto pelas ruas e pelos dias,
como a onda de uma tempestade a arrastar o mundo,
mostra-me o quanto te amei antes de te conhecer.
eram os teus olhos, labirintos de água, terra, fogo, ar,
que eu amava quando imaginava que amava. era a tua
a tua voz que dizia as palavras da vida. era o teu rosto.
era a tua pele. antes de te conhecer, existias nas árvores
e nos montes e nas nuvens que olhava ao fim da tarde.
muito longe de mim, dentro de mim, eras tu a claridade.
José Luís Peixoto
como a onda de uma tempestade a arrastar o mundo,
mostra-me o quanto te amei antes de te conhecer.
eram os teus olhos, labirintos de água, terra, fogo, ar,
que eu amava quando imaginava que amava. era a tua
a tua voz que dizia as palavras da vida. era o teu rosto.
era a tua pele. antes de te conhecer, existias nas árvores
e nos montes e nas nuvens que olhava ao fim da tarde.
muito longe de mim, dentro de mim, eras tu a claridade.
José Luís Peixoto
Tuesday, January 29, 2013
Lençóis de vento
Em nome dos que choram,
Dos que sofrem,
Dos que acendem na
noite o facho da revolta
E que de noite
morrem,
Com esperança nos
olhos e arames em volta.
Em nome dos que
sonham com palavras
De amor e paz que
nunca foram ditas,
Em nome dos que rezam
em silêncio
E falam em silêncio
E estendem em
silêncio as duas mãos aflitas.
Em nome dos que pedem
em segredo
A esmola que os
humilha e os destrói
E devoram as lágrimas
e o medo
Quando a fome lhes
dói.
Em nome dos que
dormem ao relento
Numa cama de chuva
com lençóis de vento
O sono da miséria,
terrível e profundo.
Em nome dos teus
filhos que esqueceste,
Filho de Deus que
nunca mais nasceste,
Volta outra vez ao
mundo!
Ary dos Santos
Sunday, January 27, 2013
Retrospectivas
No dia em que se comemora o holocausto, preservemos a
memória das vítimas, do seu mundo de sombras e escuridão, e de todo um drama
emocional.
Saturday, January 26, 2013
Outras visões
Nesta altura do ano, quer queiramos, quer não, o olhar
prolonga-se para além dos campos, unicamente focado nas amendoeiras em flor. De
contornos líricos, são sem dúvida imagens vivas e contemplativas que, se
desenham ao penetrar a paisagem.
Friday, January 25, 2013
Thursday, January 24, 2013
O embuste
O lobo abriu a porta e sem dizer nada foi ao quarto da avózinha
e comeu-a. A seguir vestiu as suas roupas, enfiou a touca, e colocou os óculos no
nariz.
Quando o capuchinho, depois de muito caminhar, chegou
finalmente a casa da avó, ficou muito surpreendida por encontrar a porta entreaberta.
- Bom dia. Está alguém em casa? - Perguntou ao entrar.
História do Capuchinho Vermelho (conto infantil)
Wednesday, January 23, 2013
A arte lenta
O desejo é um desastre que se vai
acumulando silencioso à sombra
de oliveiras interiores. Arte lenta,
essa que vem de longe: o ofício das ondas,
a sedução do corpo pelas rotinas do dia,
e tudo canta.
O corpo vazio, em Delfos, foi abrigo
das estrelas; um lugar invisível onde,
sendo cego, me deixei banhar em águas
primeiras. Para tudo ver. E vi o tormento,
mais amplo do que o desejo: e desejei morrer,
e morri, nas tuas sedas mais íntimas.
Casimiro de Brito
Tuesday, January 22, 2013
Novo juramento
Neste 2º. mandato, Obama, terá de dar tudo por tudo para
controlar o orçamento, cortar a despesa militar, e impor a sua agenda no que
diz respeito à batalha de alterações climáticas, ao controlo das armas, e aos direitos
dos homossexuais. Sendo a retórica uma das suas maiores capacidades, veremos se
esta nova tomada de posse irá contribuir para que, venha a corresponder às
expectativas.
Monday, January 21, 2013
Prosseguindo
caminho
como sempre caminhei, dentro de mim - rasgando paisagens, sulcando mares,
devorando imagens.
Al Berto
Saturday, January 19, 2013
Friday, January 18, 2013
O campeão
Chegava sempre mais
longe, e mais rápido, prendendo-nos a atenção. Incomum, embora pairassem
dúvidas, distinguiu-se entre os demais, até que a lucidez da consciência acabou de vez com o mito. Assim se resume o irresumível, quando já não há heróis.
Thursday, January 17, 2013
Abarcar
É
tão difícil guardar um rio
quando ele corre
dentro de nós
Jorge de Sousa Braga in Balas de Pólen, Quasi -Vila Nova de Famalicão, 2001
quando ele corre
dentro de nós
Jorge de Sousa Braga in Balas de Pólen, Quasi -Vila Nova de Famalicão, 2001
Wednesday, January 16, 2013
Desentendimento
do
mundo que malmolha ou desolha não me defendo,
nem de mim mesmo, à força
de morrer de mim na minha própria língua,
porque eu, o mundo e a língua
somos um só
desentendimento
Herberto Helder in A Faca não Corta o Fogo - Assírio & Alvim - Lisboa 2008
nem de mim mesmo, à força
de morrer de mim na minha própria língua,
porque eu, o mundo e a língua
somos um só
desentendimento
Herberto Helder in A Faca não Corta o Fogo - Assírio & Alvim - Lisboa 2008
Tuesday, January 15, 2013
Sunday, January 13, 2013
Em paz
Direccionados, maioritariamente, para o exterior,
tendemos a absorver o tumulto e a insegurança que nos chega de fora,
esquecendo-nos de cuidar de nós próprios. Aprender a aceitarmo-nos como somos
verdadeiramente foi a proposta da Brahma Kumaris para que olhemos para dentro,
num processo de verdadeiro autoconhecimento. Aceder à diferença do outro com
todas as suas singularidades, perdoando, tolerando, e esquecendo, a
fim de que evitemos vivenciar a mesma dor, não só nos proporciona paz, tanto com
os outros, como connosco próprios, como nos permite um decurso de acerto, ao
passarmos a apreciar o que nos rodeia, e sentirmo-nos gratos com o fluir da vida.
Saturday, January 12, 2013
Companheiro de excepção
Quando há 5 anos iniciei este blogue,
longe estaria de pensar que, este ganharia vida própria e seria o princípio de
tão longo percurso.Inventivo, itinerante e imediato, pressupõe reflectir a diversidade dos dias, quer quando exploro ambiguidades, ou me rendo ao assombro dum avassalador pôr-do-sol! Diferenciado, e ocupado de mim mesma, entre o dia
e a noite, é quanto basta quando sinto um desejo secreto pela ficção com
destaque para o que contemplo, num misto de fantasia e angústia, onde tudo é
dito de uma forma simples e com subtileza. Até haver vontade de improvisar e gente que queira continuar a segui-lo, o «Capricho» aqui estará a preto e
branco, por vezes intercalado a cores!
Friday, January 11, 2013
Um chá especial
Sem rumo certo, Alice continuou a
andar quando, inesperadamente, encontrou um gato risonho:
- Pode indicar-me o caminho que
devo seguir? perguntou a menina.
- Para onde deseja ir? Perguntou
o gato.
- Não sei!?
- Humm! À direita, mora o
Chapeleiro Louco; à esquerda, mora a Lebre de Março. Tanto faz, menina, os dois
são completamente malucos, disse o gato.
Sem compreender nada, mas
seguindo a sua própria intuição, Alice chegou a casa da Lebre de Março e viu-a
mais ao Chapeleiro Louco a tomar chá ao ar livre. A mesa era enorme, mas eles encontravam-se
a um canto. - Não tem lugar! Não tem lugar! Gritaram ao ver Alice a chegar. –
Há imensos lugares, disse Alice indignada, e sentou-se numa grande poltrona a
uma das cabeceiras da mesa.
- É sempre hora do chá, suspirou
o Chapeleiro, e nós não temos tempo de lavar a loiça entre um chá e outro.
- Então vocês andam à roda da mesa? Perguntou
a Alice.
- Exactamente, disse o Chapeleiro, à medida que
as coisas vão ficando sujas.
- E o que acontece quando chegam outra vez ao início?
Alice aventurou-se a perguntar.
- Eu proponho que mudemos de assunto, interrompeu
a Lebre de Março, bocejando.
Atordoada, sem nada entender,
Alice saiu dali disparada.
Thursday, January 10, 2013
Imagem
Meu amor disse que eu tinha
uns olhos como gaivotas
e uma boca onde começa
o mar de todas as rotas.
Manuel Alegre in Trova do Amor Lusíada
uns olhos como gaivotas
e uma boca onde começa
o mar de todas as rotas.
Manuel Alegre in Trova do Amor Lusíada
Wednesday, January 9, 2013
Circunstâncias
A desvalorização
salarial e o medo de ficar sem nada são os resultados menos positivos da
austeridade. Quanto ao futuro, sem dúvida que, passa por uma nova reflexão,
quando a pobreza nos apresenta a sua face, com o passar dos dias. Menos capazes
de produzir riqueza, e com os recursos de sustentabilidade do estado social a
esgotar-se, e metas a seguir a metas a falhar, só o equilíbrio poderá assegurar
uma base de crescimento que, francamente, não nos hostilize desta maneira.
Tuesday, January 8, 2013
Algures na planta do pé
Às vezes escondo-me no corpo e ninguém me vê.
As pessoas falam comigo e não notam que eu não falo com
elas.
Posso até dizer algumas palavras,
posso até exprimir-me num longo discurso,
mas a verdade é que não falo com elas.
Estou escondido algures no meio do meu corpo.
Enfio-me todo no esófago ou no centro da artéria aorta ou na
veia jugular,
e, por vezes, quando estou mais tímido, chego mesmo a
esconder-me nos músculos da planta do pé.
Apesar de não saber os nomes destes músculos escondo-me lá
muitas vezes.
Aliás, é melhor fugirmos para sítios de que desconhecemos o
nome: ficamos ainda melhor escondidos.
É a minha opinião.
Gonçalo M. Tavares
Monday, January 7, 2013
Retratos
Subitamente, no meio da confusão da livralhada, descubro o
álbum da tia Dulce. Estou cansado e sento-me. É um álbum velho, pesado como o
tempo. A capa arredonda-se em almofada, com uma dama antiga, em tons verdes e
brancos, segurando no regaço um leque fechado. Cinta instantânea, seios
pequenos, um olhar enviesado de galanteio clandestino. As folhas cartonadas só
se passam devagar; e em cada face da folha, só um ou dois retratos. Vida
efémera. Tão breve. E aí, o sonho invencível da solidez, de uma unicidade
eterna. Retrato de grupo há só um. Mas as figuras não estão centradas para um
ponto único, não nos olham nem se olham, altivas na sua independência. Viram-se
para a esquerda e para a direita, para o alto, para a frente, num desafio
arrogante. Cerro os olhos e sei de novo que toda esta gente morreu. Mas o que
mais me perturba é pensar que o rasto dessa gente está suspenso de mim. Porque
eu tenho ainda uma pequena notícia da sua vida, o eco apagado do que foi a
massa complexa do seu ser e sentir.
Vergílio Ferreira in Aparição
Saturday, January 5, 2013
Friday, January 4, 2013
Thursday, January 3, 2013
Ao sair
Não te esqueças de,
ao sair,
deixar a porta
aberta. Podes
perder a chave
e não entrar.
Ou podem roubar-ta,
o que é pior.
Porque são numerosos
os ladrões do azul.
ao sair,
deixar a porta
aberta. Podes
perder a chave
e não entrar.
Ou podem roubar-ta,
o que é pior.
Porque são numerosos
os ladrões do azul.
Albano Martins
Wednesday, January 2, 2013
Mudar o rumo
Havia hoje, ao entardecer, loucos bandos de pássaros voando nos céus da minha cidade. Iam para sul, eu sei. E como entendo a sua fuga!
Manuel Jorge Marmelo in O Porto: Orgulho e Ressentimento - Editora Campo das Letras, Porto, Janeiro 2006
Tuesday, January 1, 2013
Contagens
Quer queiramos quer não, é aqui que pertencemos,
iniciando-se hoje uma nova etapa que, só será interrompida daqui a doze meses.
Até lá, continuaremos em permanente fluxo, muitas vezes rastejando como que por
submissão, vendendo a alma por trás dum sorriso, em permanente inquietação.
Será a vida um inferno, com tudo fora do sítio, e dias após dias carregados de
nuvens? O que nos poderá relativizar amiúde as expectativas? O que evitará as
pequenas e grandes contradições? No seio de tamanha inquietude continuamos,
ciclicamente, à espera dum sinal de esperança.
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